Alguns tópicos para articular a primeira etapa do processo
de pesquisa sobre ESTUDOS INTEGRADOS EM MEIO AMBIENTE, CULTURA E SOCIEDADE: uma
perspectiva latino-americana
25/03/2015
1- Basicamente,
a primeira etapa consiste em apresentar uma problemática teórica capaz de
abordar os fundamentos epistemológicos
do conhecimento sobre as três dimensões da pesquisa: meio ambiente, cultura e
sociedade. Esses fundamentos se referem
aos processos de produção do conhecimento, desde concepções de ciência e de outros
tipos de produção social de saberes culturais, a fim de abarcar os principais
temas que compõe o projeto de pesquisa. As perguntas norteadoras desta primeira
etapa referem-se ao debate epistemológico atual que trata da questão
socioambiental desde a teoria da complexidade, a crítica que as atuais teorias
epistêmicas lançam aos modelos ortodoxos de ciência, estabelecendo uma
hierarquia fortemente estabelecida pelas “ciências duras” (Kuhn, Popper, Bunge
e demais seguidores dessas concepções e que tentam legitimar concepções de
ciência desde esses paradigmas fortemente comandados por esse modelo.
Não se trata
aqui de enveredar pelo caminho da história ou filosofia da ciência, mas de
entender o debate que ocorre no interior das diversas ciências, questionando a
linearidade progressiva da ideia de ciência, supondo que essa evolução vai na
perspectiva da descoberta de verdades sobre a natureza, o cosmos e as
sociedades, à maneira do positivismo ou do neo-positivismo.
As questões
epistemológicas derivam, com algum grau de possibilidade, dos debates inscritos
no contexto dos debates que envolvem não apenas questões inerentemente
científicas, mas que obedecem à uma multiplicidade de questões apontadas por
Bachelard (de que para a filosofia da ciência interessa a história dos erros;
questionável seria sua outra questão complementar, a saber, de que para a
história da ciência interessaria apenas os acertos!); para Koyré a história das
ciências é marcada pela descontinuidade, por erros superados, revoluções e
refundações epistemológicas; Piaget, por seu lado, defendia uma diversidade de
fontes inspiradoras da epistemologia ou daquilo que evidencia o debate para
resolver as crises e seus enfrentamentos, ou seja, problemas propriamente científicos, extra-científicos (políticos e
culturais) e meta-científicos (filosóficos ou metafísicos).
O debate atual
sobre essas mesmas questões (o que é afinal ciência e como definir os
parâmetros sobre como entende-la) podem ser localizados nas práticas e
descobertas de problemas que suscitam redefinir o significado dela e
consequentemente do mundo ou da realidade que ela busca explicar (Prigogine),
os usos sociais que derivam de suas descobertas e aplicações, bem como a
crítica social que emerge como contrapeso a esses usos e aplicações (Stenghers,
Bruno Latour, Boaventura, Leff, entre um imenso coletivo de autores críticos ao
conceito tradicional de ciência).
Neste sentido,
interessa-nos a perspectiva da sociologia e antropologia da ciência, além do
debate de uma história e filosofia críticas sobre este tema, bem como a crítica
social que emerge a esse respeito, especialmente o debate da descolonização do
conhecimento e o diálogo de saberes na perspectiva de uma epistemologia do sul.
No bojo dessa
abordagem interessa-nos igualmente indagar a respeito de uma ciência pública,
pertinente e que possa nos colocar diante das seguintes interrogações: ciência
para quê, ciência para quem e ciência com quem?
Deve-se buscar identificar que o debate sobre a legitimidade do
conhecimento científico bem como a crítica que lhe é dirigida, tanto pelos
próprios pares e seus lugares de enunciação (as universidades, as comunidades
epistêmicas, o estado financiador de pesquisas, os sistemas de controle e
sanção dessa produção científica) como dos não-lugares ou desde os extra-muros,
isto é, desde uma perspectiva de sujeitos ou agentes sociais, formados por
coletivos que possuem seus próprios sistemas simbólicos e suas práticas, bem
como um olhar crítico sobre o que se produz em termos de conhecimento no interior
das agências especializadas, como universidades, centros de pesquisa públicos
ou privados. Uma das questões norteadoras
nesta etapa da discussão é se é possível a co-existência de conhecimentos
doutos e não doutos para as questões que emergem desde o debate do
socioambientalismo.
Esse debate é
fundamentalmente um debate de caráter filosófico e político sobre o que se
entende por sustentabilidade socioambiental cujos referenciais teóricos podem
ser localizados nas questões de compreensão do que é natureza e se ela possui
direitos, de justiça ambiental, na ética ou naquilo que Leff define em seu
livro, La Apuesta por la Vida (México:
Siglo XXI, 2014)[1]
2- Já
como segunda etapa, complementar e integrada à anterior, deve-se pensar na
adição de dois outros temas que vão ter forte incidência e envolvimento com o
debate anterior e que se inscreve e institui na proposta do programa MADE
(turma XI, em 2015, como construção de uma problemática de pesquisa em comum,
intitulada CONFLITOS E (IN)JUSTIÇA AMBIENTAL, RESISTÊNCIAS, ESTRATÉGIAS E
ALTERNATIVAS DE DESENVOLVIMENTO.
Como bem sugere
esse tema comum articulador, estamos diante de um debate que envolve
atores/sujeitos/agências, dimensões de cultura e interculturalidade, governança
e estratégias participativas (democracia), bem como estratégias que apontam
para uma diversidade de experiências de construção alternativa de
desenvolvimento.
Nesta segunda
etapa, que pode vir intercalada em termos de dinâmicas de seminários, com a
primeira etapa, para evitar uma certa linearidade na abordagem dos problemas,
apresenta-se o debate sobre teorias da interculturalidade, descolonização,
teoria dos conflitos e da ação social, bem como o mapeamento das experiências
em curso sobre alternativas ao desenvolvimento.
3- As
pesquisas em andamento pelos diferentes pesquisadores que participam do
Integrado em Meio Ambiente, Cultura e Sociedade (nacionais e internacionais),
além dos participantes da linha de pesquisa de Epistemologia Ambiental do MADE
vão trazer seus resultados concretos (empíricos) nos temas relacionados a
práticas materiais, conflitos políticos e culturais sobre alternativas de
desenvolvimento. Deve-se observar também a importância que assumem as reflexões
e os balanços sobre as diferentes metodologias oriundas desses estudos em
andamento no interior do projeto maior de estudos integrados. Essas
metodologias de estudos sobre conflitos, (in)justiça ambiental, dimensões
interculturais e estratégias de desenvolvimento merecerão especial atenção,
pois uma atitude reflexiva e interpretativa sobre as práticas de pesquisa são
de fundamental importância para os programas interdisciplinares em meio
ambiente e desenvolvimento. Caberá também espaço para essas dinâmicas de
avaliação das metodologias empregadas (suas teorias e procedimentos de
pesquisa).
4- O
que devemos ter presente por ora é a organização de uma agenda de seminários
que, de comum acordo, terão que fazer parte das dinâmicas da linha, com
regularidade nos encontros (quinzenais ou a cada três semanas), com textos e
expositores inscritos e resultados esperados em termos de registro e
estratégias de publicação, além de pensarmos em atividades intermediárias em
forma de eventos, dos quais participarão todos (os que puderem, evidentemente)
os participantes do Projeto de Estudos Integrados (nacionais e internacionais).
Neste sentido,
está previsto um primeiro encontro internacional (que ao mesmo tempo é
preparatório ao V CEPIAL, no contexto da Rede Casla-Cepial), em Popayán, Valle
del Cauca, Colômbia, promovido pelo prof. Javier Tobar, antropólogo e
coordenador de Projetos do Mestrado em Estudos Interdisciplinares do
Desenvolvimento, entre os dias 17 e 20 de outubro de 2015.
5- Devemos
ter presente também as dificuldades de mobilização do coletivo de instituições
e pesquisadores envolvidos no Projeto de Estudos Integrados e de um senso de proporções que implica no
dimensionamento do mesmo, seja em termos de presença e participação de todos os
integrantes nomeados no projeto. À medida em que vamos desenvolvendo nossas
atividades (de seminários, encontros e publicações) iremos dimensionando os
diversos tipos de engajamento de cada um dos participantes. Neste sentido,
temos a possibilidade de contar também com o pesquisador da UFMA, Prof. Joaquim
Shiraishi Neto que desenvolve pesquisa sobre os direitos da natureza e as
populações tradicionais, na perspectiva comparada entre experiências de Brasil,
Bolívia, Colômbia e Equador.
A inserção de
nosso projeto na Rede Casla-Cepial busca traduzir o caráter social da produção
do conhecimento, além de buscar respostas para a questão ética de uma ciência
pública e pertinente.
6- Pauta
da reunião do Coletivo de Epistemologia Ambiental (25/03/2015)
Local: CASLA
roteiro de pauta:
- Informes gerais sobre as atividades da Rede Casla-Cepial e suas próximas atividades
- Organização da apresentação do
projeto de pesquisa da Epistemologia linha de
para Terça-Feira dia 31 de março, às 14 horas no MADE.
- Qualificação (final de maio/15) doutorado de Adriana Ruela, Mara Monteiro e Ricardo Gama.
- Outros assuntos de interesse
[1] Este livro está composto de 6
partes, além da Introdução, a saber:
Introducción: El contexto epistemológico y la apuesta por la vida (P. 15-84); 1)
Las ciencias sociales y la crisis ambiental(P. 85-141); 2) La sociedad ante la
naturaleza: la construcción social de la sociología ambiental (p. 142-222); 3)
Ecología Política: conflictos socioambientales, ontología de la diversidad y
política de la diferencia (p.223-300); 4) Imaginarios sociales y
sustentabilidad de la vida (p. 301-380); 5) Desvanecimiento del sujeto,
reinvención de las identidades colectivas y reapropiación social de la
naturaleza (p.381-443); 6) La constitución del campo socioambiental:
movimientos sociales, sustentabilidad ambiental y territorios de vida (p.
444-498).
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