A reunião ocorreu em 2 de
setembro de 2015, nominalmente a partir das 14 horas, nas dependências da Casa
Latino-Americana (CASLA). Presentes: Prof. Dimas Floriani, José Edmilson
de Souza Lima, Profª Maria do Rosário Knechtel, Katya Isaguirre, Claudia
Picone, Mara Monteiro, Alexandre Hedlund, David Fadul, Guido Mejías, Guilherme
Silva e José Thomaz. 1. Informes. Prof. Dimas apresentou o sociólogo
chileno Guido Mejías, que realiza mestrado no Programa de Pós-Graduação em
Sociologia da UFPR. Katya informou sobre visita à Itaipu Binacional (Parque
Tecnológico): relatou sobre possibilidade de realização de pesquisas com
georreferenciamento, sobre concepções de alternativas ao desenvolvimento a
partir de experiências locais, e sobre interesses de pesquisa na interface
entre epistemologia e conflitos socioambientais na América Latina, cabendo ao
Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento (PPGMADE)
apresentar interesses de pesquisa; disse haver percebido existir muito
interesse de pesquisa comum, e propôs que seja feita uma apresentação geral a
eles do Ppgmade e de seus interesses de pesquisa. Thomaz apresentou breve
relato da leitura do texto de Alejandro Moreno intitulado “Superar a exclusão,
conquistar a equidade: reformas, políticas e capacidades no âmbito social”, que
integra o livro A Colonialidade do Saber: eurocentrismo e ciências sociais;
perspectivas latino-americanas, organizado por Edgardo Lander (Buenos
Aires: Clacso, 2005): disse haver percebido, no texto, a importância das
relações de confiança que se estabelecem entre comunidades nas quais as pessoas
se conhecem mutuamente, e que essa relação de confiança provavelmente
encontraria dificuldade, se não mesmo impedimento, para ser estendida a grupos
significativamente maiores, nos quais, por assim dizer, os laços de
conhecimento mútuo ficariam tênues ou mesmo inexistentes. Prof. Dimas mencionou
a contribuição do sociólogo, cientista político e historiador norte-americano
Charles Tilly, que, em estudos sobre movimentos sociais, identificou três tipos
de reivindicações: de identidade, de permanência e de programa, e que
reconheceu a complexidade da relação entre movimentos sociais e democratização;
destacou, na obra do autor, a importância de elementos emocionais e coletivos.
Citou o economista alemão Albert Otto Hirschman, e sua proposta teórica segundo
a qual, percebido decréscimo na qualidade ou no benefício experimentado por
membros de organizações, estes podem dela sair, ou retirar-se da relação (no
original em língua inglesa, exit) ou pronunciar-se no sentido de buscar
reparar ou melhorar a relação (no original, voice). E o também
economista e cientista social norte-americano Mancur Olson, que se destacou no
contexto dos estudos sobre ação coletiva.
A obra de Charles Tilly, seus trabalhos sobre movimentos
sociais, nos anos 1970, foi um marco, ela combateu teorias economicistas e
psicologizantes, explicando, internamente, ao campo político, o processo de
mobilização coletiva. Tilly apresenta a lógica dos confrontos políticos e modo
como se relacionam com o contexto político, social e econômico. O
relacionamento complexo dos elementos culturais com os processos políticos. Seu estudo histórico comparativo sobre a ação coletiva, tem como referência os
séculos XVIII e XIX, Tilly demonstra que cada época tem um repertório diferente
e uma forma de organização que torna o movimento mais ou menos eficiente. Na
perspectiva da sua sociologia do conflito, Tilly foi um crítico do individualismo
metodológico, da microssociologia e da Teoria da Escolha Racional. O "repertório" não é propriedade
exclusiva de um dado grupo, mas uma estrutura compartilhada de conflito. Ele
pode ser mais ou menos limitado, segundo cada estrutura histórica de conflito.
O confronto é entendido como estruturante. Não se pode recorrer a um esquema de
atores lançando mão de meios para o alcance de fins específicos, ou seja, o
emprego de um repertório dado de meios, como propõe a Teoria da Escolha
Racional. O conceito de "repertório" trata de interações, relações,
entre grandes grupos de atores, e não ações isoladas. O conceito é relacional,
uma interação entre várias partes. O "repertório" é estrutural e
estruturante, engloba formas de pensar, desejos, valores e crenças e sua
transformação. É, portanto, um conhecimento social sedimentado, composto por
memórias e acordos compartilhados. Implica em padrões e nas suas variações, o
repertório delimita as possibilidades da rotina, como uma língua que varia nas
falas e dialetos, ou na performance individual. O conceito de
"repertório" é utilizado para explicar a ação coletiva, o limitado
leque de opções no confronto político, em determinados períodos históricos,
dentro de processos culturais de longa duração e de suas correspondentes
transformações sociais. Tilly chegou ao conceito de "repertório", a
partir da teoria interacionista de E. Goffman e do conceito de
"mentalidade" da Escola de Annales, extraindo elementos das duas
correntes, constituindo, assim, a sua metodologia de pesquisa e estudo da
"política contenciosa".
2. Apresentação de interesses de pesquisa
de doutorandos e de mestrando. Passou-se à apresentação dos interesses de
pesquisa dos doutorandos e do mestrando. 2.1. Interesses de pesquisa de Alexandre
Hedlund. Na exposição de Alexandre observaram-se os temas: cultura de
controle, política criminal ou criminalidade, quotidiano e criminalidade
urbana, espaço marginal, epistemologia do Sul, e cultura democrática. Prof.
Dimas e Alexandre dialogaram brevemente sobre o tema, e no diálogo surgiu
menção à Escola de Chicago (de Sociologia) e ao sociólogo francês Loïc
Wacquant. Prof. Dimas citou o sociólogo e filósofo francês Pierre Bourdieu, em
particular sua obra que ganhou a tradução A Miséria do Mundo
(Petrópolis: Vozes, 2003), e a necessidade de dar voz e vez à marginalidade.
Indagou em que medida os atores se incluem na prática de resistência e de
alternatividade; o que é a democracia em uma sociedade heterogênea; e se o
estado seria insensível à realidade dos marginalizados. Katya mencionou o
impacto ambiental dos presídios. Prof. Dimas destacou que o tema “espaço
marginal” suscita desenvolvimento interdisciplinar, citando Direito e
Antropologia. 2.2 Interesses de pesquisa de David Fadul. Na exposição de
David observaram-se os temas: conhecimento, metodologia, sujeito cognoscente,
campo ambiental, epistemologia. Foi citada a obra Compêndio de Epistemologia
(São Paulo: Loyola, 2008), organizada por Ernest Sosa e John Greco. Prof. Dimas
considerou que política é ideologia: julgamento moral. Indagou sobre a validade
de estabelecer regras gerais para pesquisa, e sobre se, em caso de resposta
positiva, uma das funções da epistemologia seria estabelecer essas regras
gerais. Considerou, também, a possibilidade de um debate acerca de uma
epistemologia política. Katya mencionou o problema de identificar o que é
dominante e o que é periférico no contexto de uma epistemologia do Sul. Prof.
Dimas fez menção à diferença entre conceito e noção, e considerou que um
sujeito cognoscente é indivíduo e também sujeito coletivo. Considerou que a
ideologia é, por assim dizer, uma espécie de cláusula pétrea do conhecimento.
E, no contexto da neurociência, citou Oliver Wolf Sacks, neurologista
anglo-americano e Comendador da Ordem do Império Britânico. Profª Maria do
Rosário comentou sobre o epistemólogo suíço Jean Piaget no contexto da cognição
e da explicação. 2.3 Interesses de pesquisa de Guilherme Silva. Na
exposição de Guilherme observaram-se os temas: saberes, gênese da
epistemologia, discurso socioambiental, conflitos, alternatividades, teoria da
complexidade, educação ambiental, e teoria das representações. Prof. Dimas
considerou que uma sociedade existe em razão das produção e reprodução materiais
e simbólicas. Katya indagou sobre a chance, se houver, de o periférico deixar
de ser periférico; citou Alain Touraine, sociólogo francês e
sócio-correspondente da Academia Brasileira de Letras; e fez menção ao contexto
da construção do discurso interpretativo dominante, com destaque para como se
constroem os discursos mantenedores de conflitos, os de busca por soluções, e os
mantenedores de invisibilidades. Edmilson perguntou se existe intenção de
realizar estudo empírico. Apresentou questões referentes às condições nas quais
são produzidos, negados, excluídos e legitimados os conhecimentos, por assim
dizer, mais do Sul do que de outro lugar; inclusive para pensar a questão dos
moradores de rua. Citou, como exemplo, o caso do Condomínio Social em Curitiba,
relacionando-o à visibilidade dos moradores de rua na qualidade de sujeitos de
direitos, e não a partir de discurso moralizante. Indagou sobre ser ou não
preciso fazer surgir um conhecimento que se reconhece como marginal. Citou a
contribuição do Prof. Francisco Mendonça, no contexto de uma epistemologia especializada,
aplicada à Geografia, e indagou sobre a existência ou não de um campo ambiental
na Geografia. Citou Pierre Bourdieu no particular em que considera que um nomos
define um habitus, e um estudo que objetivava identificar existência, ou
não, do que poderia ser chamado de colonização da geografia brasileira a partir
de concepções europeia; estudo cuja conclusão, segundo informou, mostrou não
existir tal colonização. Profª Maria do Rosário citou contribuição de Philippe
Layrargues, que convida a refletir sobre a possibilidade de uma (maior)
aproximação entre Sociologia e educação ambiental. Profs. Dimas e Maria do
Rosário comentaram sobre a prática prazerosa de produzir conhecimento; sobre o
lado bom da interdisciplinaridade enquanto exercício intelectual acadêmico.
Edmilson mencionou uma experiência de turma no processo de construção de
conhecimento interdisciplinar. Prof. Dimas, ao considerar, por assim dizer, o
lançamento das bases do pensamento que está sendo construído, indagou sobre os
subcampos que seriam necessários. Lembrou a influência que o Cristianismo
exerce na cultura brasileira, e indagou sobre os fundamentos em que se assenta
a iniciativa de dar voz aos moradores de rua. 2.4 Interesses de pesquisa de Guido
Mejías. Na exposição de Guido observou-se interesse em trabalhar
epistemologia, metodologia e confiabilidade de dados referentes a problemas
latino-americanos. Considerou que em Curitiba, cidade com relativamente alta qualidade
de vida, existem moradores de rua, seguindo-se menção ao problema de como as
instituições geram discursos. Comparando as realidades curitibana e chilena,
particularmente no que se refere a instituições, destacaram-se os conceitos de
instituição, dos sujeitos, e a tensão entre eles. E considerou-se que se o
discurso chileno, no passado, tivesse sido escrito, talvez poderia ter
resultado em consequências mais favoráveis a populações hoje em situação de
desvantagem. Prof. Dimas comentou sobre o caso de um morador de rua que, por
coerência com seu discurso, legara a seus familiares uma morada, mas que por coerência
com sua prática política, passou a viver também na rua.
Finalizando a reunião,
convocou-se a próxima reunião para o dia 16 de setembro, no mesmo local de
sempre. Na primeira parte da próxima reunião, a ideia é de continuar
aprofundando a proposta de construção de uma problemática de pesquisa que
contemple os interesses dos doutorandos e mestrando, a fim de propiciar uma
oportunidade para elaborar um documento comum que servirá, ao mesmo tempo, de
relatório do coletivo da linha de Epistemologia Ambiental e também como ponto
de partida de cada aluno para a elaboração de seus respectivos temas de
tese/dissertação. Na segunda parte da reunião, serão comentados dois capítulos
de livros, organizados por Boaventura de Sousa Santos. O primeiro deles, “Introdução: para ampliar o
cânone da ciência: a diversidade epistemológica do mundo” (co-autoria de
Boaventura de Sousa Santos, Maria Paula G. de Meneses e João Arriscado Nunes),
do livro Semear Outras Soluções: os
caminhos da biodiversidade e dos conhecimentos rivais, p. 21-121, Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 2005. O segundo capítulo, de autoria de
Boaventura de Sousa Santos, “Para além do pensamento abissal: das linhas
globais a uma ecologia de saberes”, do livro Epistemologias do Sul (Boaventura de Sousa Santos e Maria Paula
Meneses, orgs.), São Paulo: Cortez Editora, 2010.
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