Nominalmente a partir das 14 horas e 30 minutos, na Casa
Latino-Americana (CASLA).
Presentes: Prof. Dimas Floriani, Prof.ª Lúcia
Helena de Oliveira Cunha, Prof.ª Maria do Rosário Knechtel, Maria Fernanda
Cherem, Christian de Britto, David Fadul, Guido Mejías e José Thomaz. A ata da memória foi redigida pelo Prof. Dr. José Thomaz Mendes Filho)
1.
Preliminares.
Prof. Dimas disse da importância de não se perder de vista o
horizonte do projeto. Informou haver participado de avaliação de projeto de
pesquisa, e haver encaminhado solicitação de financiamento referente a edital
do CNPq, cujo resultado é aguardado para o próximo mês de julho. Destacou a
importância de o Grupo de Pesquisa trabalhar observando objetivos, focos, metas
e publicação. Informou que no dia anterior, 12 de abril, manteve contato com o
jornalista José Carlos Fernandes, do jornal Gazeta do Povo, relacionando-o a um
projeto que reúne jovens em contexto de comunicação popular. Disse que o
referido jornalista tem interesse pelo tema de pesquisa desenvolvido por Guido,
e que, ainda o jornalista, demonstrara interesse em elaborar matéria
relacionada a interesse(s) de pesquisa do Grupo. Disse ainda que, segundo o
jornalista, a elaboração de matéria jornalística com que ele trabalha requer
conexão com a realidade dos leitores, e que gostaria de realizar cobertura
jornalística do Seminário Internacional 'Territórios, Conflitos
Socioambientais, Soberania e Segurança Alimentar na América Latina', promovido
pela Rede CASLA-Cepial no próximo mês de junho. O Prof. Dimas informou que a
linha Epistemologias, Saberes, Práticas e Conflitos Socioambientais recebe
cinco novos doutorandos, e que os alunos recém-chegados à linha poderiam desde
as próximas reuniões participar das atividades do Grupo de Pesquisa,
inicialmente como observadores. E fez, ainda, breve comentário sobre editais do
CNPq e da Capes.
2. Interesses e atuação em pesquisa.
2.1 Christian
de Britto: fez menção a aulas e à necessidade de ir a Pontal do Paraná,
para interagir com a comunidade Maciel. Disse haver feito contato com Sr. Jair,
representante da associação local de pescadores, e que o diálogo com ele lhe
rendera por volta de duas horas de gravação. Disse que metade da comunidade já
se mudou, e que identifica pressão nesse sentido de mudança; e que conversou
com moradores que saíram. Disse que pretende, em sua pesquisa, verificar
impactos socioambientais de implantação de indústria petrolífera na região, em
que há, também, previsão de construção de porto de sólidos. Disse que imóveis
são lá vendidos a mui baixo preço, e que tem interesse em compreender a
dinâmica do que lá ocorre. Disse ainda que em Macaé, no Estado do Rio de
Janeiro, quase setenta por cento dos negócios com a Petrobras estariam paralisados.
Prof. Dimas perguntou sobre os fundamentos epistemológicos da pesquisa.
Christian mencionou coleta de dados, identificar fatores, itens, escolher
fatores e qualificá-los, e considerou haver fatores que representam fenômenos.
Prof. Dimas disse da possibilidade de integração com outros trabalhos em
desenvolvimento ou já desenvolvidos. Disse ainda da importância de elaborar
artigo para daqui a seis meses, e de elaborar roteiro de pesquisa. Disse que,
no mestrado, Christian contemplou método multimodal, creditado ao teórico
organizacional sueco John Donald de Raadt e sua esposa Veronica Raadt, com
inspiração em contribuição do jurista neerlandês Herman Dooyeweerd, mas que, na
atualidade, o método, por assim dizer, comporta diálogo com autores latino-americanos.
E considerou ser adequado um diálogo com outros colegas que trabalham em temas
próximos. E comentou com Guido sobre o interesse, da parte do citado jornalista
da Gazeta do Povo, por trabalho no tema tratado por Guido em sua dissertação.
2.2
Guido Mejías: informou buscar revisar trabalho que realizou no Chile
(projetos de jovens moradores de rua chilenos), adotando o método biográfico,
história de vida, a teoria do sujeito subalterno. Disse haver um grupo
latino-americano que trata desse tema, e que a pesquisa comporta entrevistas e
observações, contemplando, por assim dizer, um olhar teórico ao sujeito
subalterno, a ecologia dos saberes, e contribuição teórica do sociólogo francês
Loïc Wacquant. Prof. Dimas disse que Guido estava em bom caminho, que se
aproxima da epistemologia da margem, da criminalização do subalterno, e fez
menção ao filósofo italiano Giorgio Agamben, relacionando-o às ideias de estado
de exceção e de barbárie, e à investigação dos tipos de extensão que os
processos produzem. Prof.ª Lúcia Helena perguntou a Guido como ele trabalha com
ecologia dos saberes. Guido reconheceu uma pequena aproximação, e disse ver a
ecologia dos saberes como pluralidade de epistemologias; considerou também a
capacidade de as próprias pessoas terem conhecimento, não só o acadêmico. E
considerou que jovens de dezesseis anos têm uma lógica de apresentar-se ao
mundo. Prof. Dimas fez menção a como esses jovens desenvolvem suas estratégias
de percepção do mundo. E, recuperando a menção feita pela Prof.ª Lúcia Helena,
considerou que a ecologia dos saberes dialoga com a natureza, e que acredita
que essa proposta se aproxima da obra do professor português, Grande Oficial da Ordem
de Sant'Iago da Espada, Boaventura de Sousa Santos. Prof.ª Lúcia Helena
considerou que meninos de rua são expropriados de seus saberes, e lembrou da
sociologia das ausências, de Boaventura de Sousa Santos. Prof. Dimas fez menção
ao Prof. Fernando Codoceo, da Universidad de Los Lagos (Chile), no particular
das investigações deste no contexto da relação entre discurso neoliberal e
reconstituição de um sujeito neoliberal introjetado na marginalidade. E
enfatizou a importância do foco. Guido disse que deve tratar também de aspectos
teóricos. Prof. Dimas fez menção ao
cientista social, antropólogo, sociólogo e escritor canadense Erving
Goffman, que, em sua obra, contempla instituições como asilos, conventos e
manicômios, dentro das quais a luta da pessoa é por reconstituir-se moralmente,
tendo em vista que lutam por sua identidade e contra a instituição que sobre
ela exerce poder. E disse, ainda, ser importante focar nas questões que se
revelam promissoras. Prof.ª Maria do Rosário fez menção aos kibutzim,
identificando-os como coletividades a cujos moldes quem nelas decide entrar
precisa adequar-se, em particular no que se refere à destituir-se de bens, que
passam a pertencer ao kibutz. Citou que a produção do kibutz
pertence à coletividade; que, nele, as crianças não coabitam com seus pais.
Prof.ª Lúcia Helena observou que, diferentemente de nas instituições estudadas
por Goffman, nos kibutzim existe opção de entrar ou não. Prof.ª Maria do
Rosário disse que, nos kibutzim, crianças até os três anos pertencem à
coletividade; que seus habitantes não dispõem de dinheiro, mas que o kibutz
efetua pagamento para as compras que seus membros realizam. Prof. Dimas
observou que muitos dos fundadores dos kibutzim são de inspiração
socialista. E fez menção à concepção sobre “o homem novo”, creditada ao médico
e guerrilheiro argentino-cubano Ernesto “Che” Guevara, no que se refere à
consideração de que, no capitalismo, os estímulos são de natureza material, e
no socialismo, moral. Christian fez menção ao comunitarismo e ao
individualismo, que considerou como extremos. Prof. Dimas ponderou que o
egoísta sofre privação (de amizade, por exemplo). Christian considerou ser o
individualismo, em certo sentido, míope. Prof.ª Lúcia Helena fez menção à
dialética entre indivíduo e sociedade. Prof. Dimas fez referência à filosofia
do apego e à filosofia do desapego, e ao que é intermediário entre ambas.
2.3
Prof.ª Maria do Rosário: disse que ela e Thomaz elaboraram um primeiro
roteiro; que a ideia é, primeiro, elaborar referencial e, depois, identificar
categorias viáveis para o tratamento do contexto latino-americano. Disse haver
autores contrários à multiculturalidade, em consonância com a ideia de que a
abordagem multicultural pode favorecer uma cultura em prejuízo de outras. Prof.
Dimas mencionou indagação, que creditou ao filósofo prussiano Immanuel Kant,
quanto a sermos ou não indivíduos emancipados. Prof.ª Maria do Rosário fez
menção ao sociólogo peruano Danilo Martuccelli. Prof. Dimas indagou sobre o que
seria uma outra matriz, tendo em vista que o indivíduo kantiano é muito
centrado na razão, no indivíduo e nos pretendidos imperativos categóricos
universais, a partir da cultura eurocêntrica. Fez menção ao sociólogo peruano
Aníbal Quijano, no particular relacionado à ideia de que a modernidade emerge
com a América Latina de modo diferente do vivenciado na Europa. E considerou
que, na porção latina do Novo Continente, a modernidade teria emergido no
contexto de uma teoria da descolonização. Citou o exemplo da medicina mapuche
praticada em Osorno (Chile), em cujo contexto, segundo disse, o nascimento de
bebês observa práticas mapuches. Prof.ª Maria do Rosário relatou, brevemente,
visita a Havana (Cuba), e disse que lá observou base de tratamento
fitoterápico. Prof. Dimas fez menção à cultura colombiana misak, destacando,
sobre ela, algumas particularidades: casa da mulher adolescente, edifícios
circulares, escolas que ensinam anciãos, e negociação com o governo, mas com
autonomia.
2.4 Thomaz: disse que, no texto em desenvolvimento com Prof.ª
Maria do Rosário, a questão da dignidade humana considera, como referências, as
contribuições do erudito nascido no ducado de Módena e Régio Giovanni Pico
della Mirandola, conde de Concordia e de Mirandola, e de Immanuel Kant. Disse
da importância de que processos educativos enunciem os valores que defendem,
para que adultos possam decidir sobre se querem ou não participar de tais
processos, e, na educação de não adultos, essa decisão possa ser feita por quem
por eles seja responsável. E fez breve comentário sobre a concepção de
alteridade no modo como a percebera ao consultar alguns livros do filósofo
lituano naturalizado francês Emmanuel Lévinas. Prof.ª Lúcia Helena disse querer
resgatar tema de pesquisa sobre saberes. Prof. Dimas propôs elaboração
epistemológica dos temas seguida de capítulos que contemplem temáticas
específicas, no formato de livro. Prof.ª Maria do Rosário disse que uma
proposta assim estruturada não inviabiliza novas possibilidades, mediadas por
experiências de vida. Prof.ª Lúcia Helena disse da intenção de trazer ao
Seminário Internacional agendado para junho atores da cultura indígena,
considerando que o Paraná tem cultura europeia. Prof. Dimas e Maria Fernanda
sugerem participação de um senhor chamado Douglas, do Rio Grande do Sul.
Christian fez menção a Lévinas, considerando a possibilidade de sua filosofia
se aproximar de uma filosofia judaica. Prof. Dimas fez menção à recepção do
trabalho de Lévinas por parte do engenheiro mexicano e doutor em economia do
desenvolvimento Enrique Leff.
2.5 David Fadul: no contexto de seus
interesses de pesquisa, fez menção ao conceito de télos, com o sentido
de propósito de uma determinada ação do sujeito cognoscente. Considerou que nem
todo télos é compartilhado por sujeitos individuais, e que sujeitos
cognoscentes têm télos comum, o que não se trata de algo necessariamente
consciente. Apresentou questão sobre se regras do discurso são objetivados ou
objetiváveis. Interrogou sobre a existência de componentes estéticos no
discurso. Considerou também não ser por que um valor é admitido no discurso que
ele seria real, e indagou sobre a possibilidade de, na prática, os valores
serem outros que aqueles manifestados, verbalmente, no discurso. Considerou,
ainda, a possibilidade de haver fetichismo no discurso epistêmico. E disse
parecer não haver, em considerável número de casos, conformidade entre discurso
e prática acadêmicos. Partindo de menção ao economista norte-americano Richard
Norgaard, considerou que os teóricos, ao descreverem as promessas da
modernidade, parecem imaginar que seus interlocutores concordariam com seus
supostos. Disse que a ligação do discurso a determinado autor melhora
consideravelmente a apresentação do argumento, e, nesse particular, citou
Ronald Coase, economista inglês agraciado, em 1991, com o Prêmio Sveriges
Riksbank de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel; citou-o no
particular em que sua teoria criticava a proposta do também economista inglês
Arthur Pigou. Prof.ª Lúcia Helena perguntou se se tratava de construção
cultural. David disse que sim, se a hipótese for concreta. Prof. Dimas
perguntou se David não poderia renunciar ao télos como o filósofo
austríaco Ludwig Wittgenstein renunciara a uma referência matemática abstrata,
do conceito puro, em especial por ocasião de seu contato com o também filósofo
austríaco Paul Feyerabend, que o teria incentivado a deixar aquela qualidade de
referência em favor de “olhar o mundo” (“Não pense. Olhe para o mundo”!). David
citou o Tractatus Logico-Philosophicus (Wilhelm Ostwald's Annalen der
Naturphilosophie, 1921), de Wittgenstein, com introdução do filósofo e
matemático galês Bertrand Russel, 3º Conde Russel, agraciado, em 1949, com a
Ordem do Mérito, e em 1950, com o Prêmio Nobel de Literatura; mencionou o
conceito de atomismo lógico; e considerou que uma ação humana tem um propósito
ou um motivo. Prof. Dimas considerou que se o télos não for estritamente
racional aproxima-se de ideias do sociólogo alemão nascido na Prússia Max Weber,
para quem haveria diversos tipos de racionalidade: em relação a fins
(instrumental) em relação a valores (axiológica) e em relação à tradição
(afetiva); porém, nenhuma delas é estritamente exclusiva. Indicou
possibilidades de diálogo com ideias do filósofo francês Michel Foucault, do
próprio Wittgenstein e do filósofo francês nascido na Argélia Jacques Rancière,
este último no particular em que discorre sobre a ideia de dissenso. E fez
menção, também, ao quinto capítulo de sua obra Crítica da Razão Ambiental:
pensamento e ação para a sustentabilidade (São Paulo: Annablume, 2013),
intitulado “Atores e construção de redes de significados: racionalidades
híbridas para um pensamento alternativo?”. David considerou que uma metodologia
só faz sentido se em conformidade com o télos em questão; que ela deve
ser afinada com o télos e com os pressupostos. Prof. Dimas considerou
que nem sempre o télos é tão visível no contexto do conhecimento; que o télos
seria autopoiético, como o Direito: sofre-se a ação de si próprio, com o outro;
e pediu a David que elaborasse a proposta com apoio de autores.
3.
Considerações finais.
Foram tecidas
algumas orientações gerais de como ir
avançando nas reflexões e nos produtos (a fim de visarmos, até o final do ano,
a produção de capítulos para o livro). Como pano de fundo das reflexões
epistemológicas, há alguns temas transversais oriundos da discussão coletiva,
cuja amarração pode ser feita por meio de algumas categorias ou palavras-chave:
epistemologia das margens, sujeitos subalternos e criminalização,
interculturalidade (encontro ou embate das modernidades reinventadas neste
diálogo norte-sul), sujeitos cognoscentes, emaranhado e telos (a última
abordagem do David). Prof. Dimas disse ainda querer convidar o Prof. Dr.
Nicolas Floriani, da Universidade Estadual de Ponta Grossa, e a Prof.ª Dra. Ana
Tereza Reis da Silva, da Universidade de Brasília. Informou detalhes sobre o
Seminário Internacional agendado para junho próximo, que contempla projeto
editorial bilíngue com o título “Semeando Novos Rumos / Sembrando Nuevos
Senderos”, e consultou os presentes sobre a possibilidade de participarem
como membros da comissão científica de mestres e doutorandos. Prof.ª Maria do
Rosário disse poder colaborar; disse que Ricardo Colatusso, doutorando
recém-ingresso no MADE, também poderia ajudar. Prof. Dimas, ao finalizar,
destacou a necessidade de operar algoritmos em conformidade com a realidade.
Curitiba, 19 de abril de 2016.